domingo, 23 de agosto de 2015

DISCUSSÕES NO CONGRESSO

Financiamento do SUS vira alvo diante de crise econômica

Para analistas, medidas como a Agenda Brasil colocam em risco a universalização do Sistema Único de Saúde

22:00 · 22.08.2015
O quadro do sistema público de saúde brasileiro é grave já há alguns anos. Em tempos de crise, o setor sofre um novo baque com a falta de recursos e o ajuste fiscal do governo federal, que trouxe um corte de R$ 11,77 bilhões no orçamento da área em 2015. Para sanar o problema do subfinanciamento, avaliado pelos especialistas como a principal demanda do Sistema Único de Saúde (SUS), surgem propostas, muitas vezes controversas, no Congresso Nacional, as quais em vez de trazer a cura podem levar o cenário para a UTI.
Numa tentativa de debelar a crise e retomar o crescimento do País, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), lançou, no último dia 10, a Agenda Brasil, que, entre outros pontos, chegou a cogitar a cobrança de serviços no SUS para brasileiros com alta faixa de renda. Alvo de críticas de setores do governo e da sociedade civil, o peemedebista recuou.
"Ao tomar conhecimento da proposta cheguei a pensar que estava delirando. Nada mais retrógrada. A reação foi tamanha que o senador retirou-a em menos de 48 horas. De positivo, o reconhecimento, agora definitivo, do subfinanciamento do SUS", criticou o secretário executivo do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e ex-secretário estadual da Saúde do Governo Lúcio Alcântara (2003-2006), Jurandi Frutuoso.
Na avaliação do ex-secretário estadual da Saúde do Governo Cid Gomes (2007-2010), João Ananias, a taxação dos serviços do SUS rediscute a Constituição Federal, que determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, com acesso universal e igualitário. "Na hora que se propõe cobrar, estamos amputando o princípio basilar dos eixos prioritários que nortearam a criação do SUS que é a universalidade", afirmou.
O vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e professor do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia (DSC-Famed/UFU), Nilton Pereira Junior, considera que a possibilidade de cobrança de cidadãos assistidos pela rede pública de saúde, de acordo com a faixa de renda, ampliaria as diferenças de qualidade dos serviços e resultaria na completa segmentação do já desigual sistema de saúde brasileiro.
"Cobrar de alguns pelo atendimento em saúde, pela vacinação, pelo tratamento do HIV/Aids, pelo transplante, pela urgência e emergência, dentre tantos exemplos, é aniquilar políticas que só deram certo porque são universais. Graças à ampla e firme reação do Movimento da Reforma Sanitária Brasileira, além da crítica do atual ministro da Saúde e de dois ex-ministros, ocorreu um recuo", avaliou.
Apartheid
A presidente do Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes), Ana Costa, compartilha da mesma opinião, observando que a proposta penalizaria os mais pobres e criaria um apartheid na assistência. Apesar da reação contrária à medida, ela diz não ter a ilusão de que o projeto seja esquecido. "Sabemos que essa proposta retornará a qualquer tempo. Ela está no manual do Banco Mundial, no manual do liberalismo que orienta que a saúde é mercado, é negócio e não direito coletivo", afirmou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário