domingo, 4 de dezembro de 2016

Cachaça premium. A danada sofisticando paladares

Nas prateleiras e nos cardápios do Ceará e de outros estados, a danada da cachaça conquista os paladares dos brasileiros. Mas não é qualquer cachaça. Com sabores mais refinados, em sua maioria fabricada artesanalmente, uma garrafa de pinga chega a custar mais de mil reais. Apenas nos corredores dos Mercadinhos São Luiz, a venda da branquinha cresceu 40% este ano ante 2015.
 
O público atraído pelo sabor da cachaça “de luxo” é variado. Luiz Fernando Ramalho, gestor de bebidas dos Mercadinhos São Luiz, diz que vai do jovem ao velho. O tíquete médio delas na empresa é de cerca de R$ 50. A mais cara custa R$ 400. Somando todas as vendas do mês, a empresa fatura R$ 100 mil com a bebida. Dentre as que fazem sucesso na prateleira estão as cearenses Cedro do Líbano e Gole de Ouro.
 
Raul Busgaib é sócio-diretor da Cachaça Gole de Ouro, que tem capacidade de produzir 4,5 mil litros por semana distribuídos em 14 produtos. Ele avalia que há cinco anos a imagem da branquinha vem mudando. “Inclusive tem muitas mulheres, que antes não era comum se ver, apreciando a cachaça”, diz. O interesse maior pela bebida, que antes era vista como de papudinho, “cresceu também por influência do estrangeiro gostar de beber”. 
 
Dentre as 50 melhores cachaças que figuraram na segunda edição do “Ranking Cúpula da Cachaça”, realizada em janeiro deste ano, está a Cedro do Líbano, produzida em Carnaubal, na microrregião da Ibiapaba. A responsável por produzi-la é a Fazenda Libanus, que concentra seus outros três negócios em São Gonçalo do Amarante.
 
A capacidade de produção é de 500 litros por dia da Cedro do Líbano. Contando com a Cachaça de Rolha, também produzida da Fazenda Libanus, 30% do faturamento da empresa são obtidos com a pinga. “A gente vende tudo que produz. Estamos nos preparando para exportar para o Caribe em 2017”, diz Rodrigo Bitar, gerente de marketing da Fazenda Libanus.
 
No rol das quase mil cachaças que possui o Engenho Dedé, uma cachaçaria no shopping Iguatemi, está entrando a cearense Cedro do Líbano. Para figurar nessa prateleira, teve que fazer acordo com a distribuidora mineira Savana, que tem exclusividade com o Grupo Ral Empreendimentos, detentora do Engenho Dedé. “A cachaça está nesse processo de ser reconhecida como bebida de alta qualidade, diz Sidnei Dutra, superintendente do Grupo.
 
Marcos Bandeira, engenheiro, é apreciador da danada. Ele diz que a cachaça era uma bebida estigmatizada. “Com grata surpresa vi surgir cachaças goumert, atingindo até preços estratosféricos”, avalia. 

BEBIDA TRADICIONALReconhecida lá fora, mas em baixa de vendas no Brasil
Premiadas no Brasil e no mundo afora, as cachaças cearenses também caíram no gosto dos estrangeiros, mas, no Brasil, têm as vendas pressionadas pela alta carga tributária. Em outubro de 2016, por exemplo, a Ypióca recebeu seis medalhas como reconhecimento de sua qualidade, em dois concursos internacionais, a “New York World Wine and Spirits Competition 2016” e o “Spirits Selection by Concurso Mundial de Bruxelas”. Mas mesmo com destaque internacional, as vendas da Ypióca não vão bem. 
 
Nelcina Tropardi, diretora de Relações Corporativas e Jurídico da Diageo (detentora da Ypióca), diz que a alta carga tributária sobre bebidas destiladas impactou o segmento como um todo, em especial, a rentabilidade na categoria cachaça. A redução foi de 6% em volume de vendas no Estado, no ano. No curto prazo, a tendência de queda é ainda maior – em setembro o volume caiu 9% ante mesmo período do ano passado.
 
A avaliação de que o mercado estagnou também é de Edilson Bieh, agrônomo e produtor da Cachaça Viçosa, do município de Viçosa do Ceará. Com capacidade de produção de 10 mil litros por mês, o público consumidor é predominantemente de pessoas da região e de turistas. “Eles têm boa parcela no consumo dessa cachaça”.
 
Cláudio Targino, presidente da Colonial Indústria de Bebidas e do Sindicato de Bebidas do Ceará (Sindibebidas), diz que a crise para o setor começou há algum tempo.
 
“Tem se destacado as premium, e aqui posso citar a Colonial Tradição”. A própria empresa, que completou 93 anos, limita-se a envasar a cachaça premium.
 
Perdeu o interesse pela grande produção, devido às dificuldades das leis brasileiras, cargas tributária, previdenciária e “o mais sério”, falta de pessoas que queiram trabalhar no campo. (Beatriz Cavalcante) 

Bate-pronto

O POVO - Quando começou a tendência de gourmetizar a cachaça?
Carlos Lima - O aparecimento do mercado premium teve início em 2008/2009. Foi tendência natural. Um processo de evolução. Os produtores começaram a investir em melhorias de qualidade, em embalagens, seguindo tendência de mercado, e o consumidor passou a buscar produtos premiuns, respondendo à tendência de mercado. Mas, esse foi um segmento que vinha crescendo ao longo dos últimos anos e foi extremamente impactado com aumento da alíquota do IPI em 25% . Depois desse cenário de aumento de impostos, teve uma redução de 4% do mercado como um todo. Existem produtores que chegaram à redução de quase 20%.

OP - Quais os principais produtores e consumidores da bebida?
Calors - Produtores registrados no Ministério da Agricultura são 1,5 mil. Se falar de informalidade, são mais de 9 mil, porque são 11,34 mil empresas segundo o último censo do IBGE. Os maiores produtores são Ceará, Pernambuco, São Paulo e Paraíba. Maiores consumidores são Ceará, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais.

OP - O que é uma boa cachaça?
Carlos - Você nunca vai definir o que é a melhor cachaça, porque o Brasil produz excelentes cachaças. O que a gente entende como produto de qualidade é o que segue a legislação do Ministério da Agricultura. 
 
Carlos Lima, presidente do Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac)  

Saiba mais

Para beber
Altino Farias, sócio proprietário do Empório Embaixada da Cachaça, diz que possui 300 opções da bebida. Os preços vão de R$ 20 até R$ 1,2 mil. As mais caras são as mineiras Havana e Anísio Santiago

O Cantinho do Frango tem 348 rótulos. Há garrafas, como a Weber Haus, que chegam a custar R$ 1,9 mil. “Vendemos umas 15 garrafas e cerca de 300 doses por semana”, contabiliza Iranildo Rodrigues, superintendente do Cantinho do Frango

O chef André Parente, dono do Engenho Dedé, sugere que a cachaça com sabor apurado da madeira vai bem com uma feijoada. A mais leve, em que se sente mais o sabor da cana, vai bem com peixe

Rodrigo Bitar, da Fazenda Libanus, diz que uma cachaça premium geralmente envelhece de um a três anos. Acima disso é a extra premium

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