O massacre ocorrido na manhã de ontem em Suzano, em São Paulo, que resultou em dez pessoas mortas devastou o País inteiro. A manhã desta quinta-feira, que deveria ser a sequência de uma rotina, traz o luto e o eco de uma tragédia. Era a hora do intervalo na escola Escola Estadual Raul Brasil, quando dois jovens adentraram o local e atiraram contra estudantes e funcionários.
Caio Oliveira, 15; Claiton Antônio Ribeiro, 17; Douglas Murilo Celestino, 16; Kaio Lucas da Costa Limeira, 15 e Samuel Melquíades Silva de Oliveira, 16, eram estudantes da escola e não sobreviveram. Também foram assassinadas as funcionárias Marilena Ferreira Vieira Umezo, 59, e Eliana Regina de Oliveira Xavier, 38. Ao final dos disparos, os assassinos Guilherme Tauci Monteiro ,17 e Luiz Henrique de Castro, 25, também foram mortos. Antes, Jorge Antônio Moraes, 51, tio de Guilherme também foi alvo.
A Polícia Civil busca compreender o crime e já sabe que houve um plano meticulosamente organizado. O secretário de Segurança Pública de São Paulo, João Camilo Pires de Campos, disse que policiais coletam depoimentos e provas. Segundo ele, é possível confirmar alguns detalhes sobre o que ocorreu antes e durante o massacre no colégio.
Logo no início da tarde de ontem, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo deu as informações preliminares sobre a tragédia. O massacre teve início numa locadora de carros, onde mataram a tiros o empresário Jorge Antônio Morais. Os dois assassinos seguiram num veículo Chevrolet Onix branco que foi estacionado em frente ao portão da escola. Vestidos com roupas pretas, botas e balaclavas cobrindo o rosto, os jovens carregavam um revólver calibre 38, quatro jet luders (instrumentos usados para recarregamento de arma), uma besta (tipo de arco e flecha que dispara na horizontal), um machado, além de um arco e flecha tradicional e coquetéis molotov. A dupla ainda carregava uma mala com fios, simulando uma bomba. Contudo, o esquadrão antibombas descartou os riscos do objeto explodir.
Uma das hipóteses da polícia é de que eles tiveram o acesso facilitado por serem ex-alunos do local. Após matar a coordenadora pedagógica e outra funcionária da escola, os dois atiradores passaram a tomar como alvo os alunos. De acordo o secretário da Segurança Pública de São Paulo, todos os disparos foram aleatórios.
Quando estavam prestes a entrar em uma sala com dezenas de estudantes escondidos com medo dos disparos, Guilherme e Luiz Henrique avistaram a cerca de dez metros agentes da Força Tática. A polícia foi acionada por causa do ataque na locadora de veículos e chegou à escola em oito minutos. Ao serem surpreendidos pelos policiais, um jovem atirou no outro e depois suicidou-se.
Por meio de nota, a Secretaria da Educação de São Paulo informou que toda a comunidade escolar do estado está de luto. A pasta informou ainda que os profissionais da rede de ensino vão se reunir na manhã de hoje para definir ações a serem realizadas nas escolas com os 26 mil alunos da rede a partir de segunda-feira, 18. A ideia é "conscientizar e combater a violência e o assédio moral, visando estabelecer uma cultura de paz".
"Este foi um atentado à educação brasileira e a todos os cidadãos, que diariamente, no interior de cada escola, trabalham por um Brasil desenvolvido", lamentaram. (Com Agências)
Quem eram os atiradores?
Apesar da diferença de idade, Luiz Henrique de Castro, 25, e Guilherme Taucci Monteiro, 17, eram muito próximos. Eles se conheciam desde a infância e desenvolveram uma amizade mais sólida nos últimos dois anos. Os vizinhos disseram que os dois eram reservados.
Guilherme morava a três casa de distância de Luiz, com o avô e duas irmãs mais novas. A avó faleceu há quatro meses de pneumonia. Segundo pessoas próximas, a mãe dele, Tatiana, sofre de dependência química e nem sempre estava por perto. O rapaz cresceu sem muito contato com o pai. O adolescente havia saído da Escola Raul Brasil no 2º ano.
"Ele dizia que estava constrangido com as espinhas. Eu paguei um tratamento para ele, Roacutan, e ele já ia voltar para fazer o supletivo. Desde que a avó morreu, ele dizia que ia trabalhar com o amigo dele, que foi lá com ele (Luiz), para me ajudar", conta.
Luiz era o caçula de três irmãos de um casal de idosos, o pai de 68 anos e a mãe de 65 anos. A família do rapaz não falou com a imprensa. Ele trabalhava com o pai, em serviços de capinagem. À noite, saia com Guilherme para LanHouse do bairro.
"Sempre vinham aqui juntos. Vinham aqui umas três vezes por semana. Eram calados, tímidos. Não falavam com ninguém. Mas eram tipo antissociais", conta a funcionária da LanHouse que o par frequentava, Nádia Cordeiro. Segundo funcionários do estabelecimento, os jogos preferidos dos dois eram de tiros (Call of Duty) e luta (Mortal Kombat).
Os dois amigos também usavam a Internet nos computadores da LanHouse. A polícia levou uma das máquinas, a de número 9, para periciar. A expectativa é que se encontre pistas que possam elucidar as motivações do massacre. Nenhum deles tinha antecedentes criminais ou histórico de distúrbios psiquiátricos diagnosticados. (Isabel Filgueiras)
Episódio levanta discussões pedagógicas e de segurança
Para especialistas, o fato ocorrido em Suzano, São Paulo, traz referências à problemática norteamericana de ataques em escolas e levantam discussões sobre aspectos psicopedagógicos e também na área da Segurança Pública, especialmente no que diz respeito às legislações sobre o armamento.
Para Wanderley Codo, professor do Departamento de Psicologia da Universidade de Brasília (UNB), há um aumento no número de episódios violentos nas escolas e há ainda uma tendência de aumento desses casos. Conforme ele, as últimas propostas políticas de Educação tendem a afastar professores de alunos. "Está transformando o professor num estranho, num elemento que policia o aluno ao invés de educar o aluno", critica. Conforme ele, é preciso que se aumente a confiança e os espaços de discussões no ambiente escolar.
No Brasil, já ocorreram outros oito ataques em escolas. Ricardo Moura, pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Violência da Universidade Federal do Ceará e colunista do O POVO, pondera que há o que ele chama de referência norteamericana. "A gente observa que isso de alguma forma vem sendo copiado, a gente vê que a prática , o gestual, as roupas, procuram emular esse tipo de prática. E aí entra também uma outra coisa, lá as armas são bem mais acessíveis,uma pergunta que tem que ser feita é: de onde conseguiram obter essas armas?", questiona.
Para a psicóloga e psicanalista Thais Leite, do Instituto de Especialidades Clínicas, tanto o período conflituoso da juventude e adolescência quanto a ascensão dos discursos de ódio merecem destaque nesta discussão. "A adolescência já é uma passagem violenta porque a pessoa sai da infância para a vida adulta e é convocada a assumir responsabilidades que não precisava ter. O que precisa ser compreendido é o que levou essas pessoas a projetarem na escola esse local de ódio", diz.
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