sábado, 22 de agosto de 2015

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara aprovou, nessa terça-feira, 18, o Projeto de Lei 6268/09, que prevêprisão de até dois anos para quem obstruir indevidamente a via pública. Os casos de bloqueio podem incluir, além uma manifestação política que impeça o tráfego de veículos, o depósito de mercadorias na via. O autor, deputado Maurício Quintella Lessa (PR-AL), defende que a prática é perigosa e aumenta o risco de acidentes. A proposta ainda será votada em Plenário. 

O presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB-CE, Fábio Zech, explica que o projeto aparenta criminalizar a conduta de fechamento de vias de forma ampla, restringindo o direito de manifestação à prévia autorização do poder público. “Pelo direito penal, baseado no princípio de intervenção mínima, devem ser crime as condutas realmente relevantes, que afetam bens jurídicos relevantes. O segundo ponto é em relação ao direito de manifestações, que de acordo com nossa constituição não pode ser condicionado à prévia autorização”, frisa. 

Para Zech, a lei permitirá a detenção de manifestantes que fecham ruas para reivindicar direitos, comprometendo “em demasiado” o direito de expressão e de liberdade garantidos pela Constituição. “Em tese, os deputados têm a liberdade de aprovar os projetos de lei na CCJ, e em momento oportuno a inconstitucionalidade poderá ser reconhecida. Eu não discuto o incômodo ou que compromete a organização administrativa, eu falo no tocante ao direito de manifestação”, avalia. 

O advogado Patrick Mariano Gomes, da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (Renap) em Brasília, concorda que o projeto compromete o direito de manifestação e acrescenta que uma lei do tipo é “desnecessária”. “O poder público já tinha instrumentos suficientes para atuar nesses casos. Nenhum dado concreto sobre prejuízo pelas interrupções de fluxo foi apresentado. É a mesma CCJ que aprovou a PEC da maioridade, que no lugar de resolver conflitos sociais, insiste na penalização”, explica.

Patrick ainda questiona controle da aplicabilidade da lei, bem como o abuso de autoridade, que ganha margem de manobra. “Essas leis de penais abertas servem como salvo conduto contra o cidadão, é uma coisa assustadora, não sabemos para onde isso pode levar. Adotam instrumentos com poder de punição sem nenhum controle. Você acaba entrando no direito das pessoas de se expressarem e ocuparem os espaços públicos, o direito à cidade”, diz ele. 

O relator original da proposta era o deputado Luiz Couto (PT-PB), que considerava o limite às manifestações antidemocrático. O relatório dele foi derrotado. Aprovada na CCJ, ela segue trâmite até ser votada no Plenário.

Justificativa
Quintella afirma que os bloqueios por causa de protestos pioram a segurança no trânsito e acarretam "prejuízos diversos, na mormente na esfera econômica das pessoas direta ou indiretamente atingidas”. Atualmente, o Código de Trânsito Brasileiro prevê sanções administrativas para quem obstruir vias públicas.

A pesquisadora da UFC e da Frente de Luta por Moradia Digna (LEHAB), Valéria Pinheiro, afirma que o projeto é ‘’um absurdo no sentido da criminalização dos movimentos sociais’’. “É sintomático, a rua é espaço dos protestos por excelência, então é uma sentença de morte para as manifestações. Na balança, não se compara um incômodo momentâneo de quem vai chegar atrasado com o protesto de uma multidão, que visa direitos coletivos”, completa. 

O que os movimentos pensam
“Nós achamos um absurdo para a democracia brasileira, esse projeto que enquadrar as manifestações populares, que lutam por direitos, justamente democráticos. Coloca todos os protestos como uma vala só, nos somos contrários, é uma arbitrariedade, o movimento não é terrorista, essa lei é um retrocesso” - Odair Magalhães, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Ceará (MST-CE).

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