domingo, 27 de abril de 2014

MÚSICA

Caymmi, 100 anos

27.04.2014

Antena sentimental e poética do País, Dorival Caymmi completaria um século dia 30. Seu legado, um elogio à simplicidade

dorival
Dorival Caymmi e seu violão, em 1938, no ano que chegou ao Rio de Janeiro
FOTO: EDITORA 34/ DIVULGAÇÃO
O ritmo, da vida e da música, na Bahia, foi marcado essencialmente por três andamentos no século que passou: lento, muito lento e Caymmi. Brincadeira, claro - contada por Oswaldo Montenegro em prelúdio para a música "Maracangalha" (que registrou no disco "Letras Brasileiras", de 1997). A assertiva não deixa de ter um fundo de verdade e revelar um pouco a vida, as canções e a própria identidade do baiano que Dorival Caymmi ajudou a criar.
Nascido em 30 de abril de 1914, em Salvador, e adotado pelo Rio de Janeiro, Dorival Caymmi completaria um século na próxima quarta-feira. Faleceu aos 94 anos, em 2008, deixando um legado ainda hoje fundamental para a música - e a musicalidade - brasileira.
"Ele sempre se preocupou em fazer músicas, não para ele, mas para o povo. A música que ele gostaria de ter feito, para você ter ideia, era 'Ciranda cirandinha'", ilustra Danilo Caymmi, sobre a obra do pai, que apesar de fazer suas canções parecerem cantigas, imprimia em suas melodias a inspiração que passava pelos clássicos universais de compositores como Debussy, Ravel e Sebastian Bach.
"Ele entendeu muito o povo brasileiro. Viajo fazendo shows, você toca suas músicas em qualquer lugar, as pessoas conhecem e até associam, muitas vezes, ao folclore", diz.
A leveza no ritmo e na maneira de lidar com a vida de Caymmi, registrada na brincadeira de Oswaldo Montenegro, e na própria "Maracangalha", é uma faceta do músico que, na simplicidade do seu violão, captou uma aura popular, na malícia de "A Vizinha do Lado" e "O que é que a baiana tem", no amor, em "Morena do Mar", "Só Louco", na religiosidade e tradição de "Dora". Suas marcas, como intérprete e compositor, colocam em um mesmo plano, popular e universal, a partir de canções que vão do bom humor de "Você já foi à Bahia" às tragédias de algumas composições praieiras.
Décadas
Sob a perspectiva histórica da música brasileira, o compositor tem o mérito de ser o único, talvez, presente em todos os grandes momentos, no século passado, em especial, os de projeção internacional. De Carmen Miranda a João Gilberto e Tom Jobim.
"Quando Carmen Miranda estourou na Broadway, e depois no mundo, cantava o quê? Caymmi. Quando João Gilberto vai ao Carnegie Hall, o que canta? Além de Tom e Vinicius, Caymmi. Ele faz isso, sem nunca ter tido uma carreira internacional. Foi apenas uma vez para Estados Unidos", atesta a biógrafa, e neta de Dorival, Stella Caymmi.
Doutora em literatura brasileira com tese sobre o avô, Stella está relançando este mês sua "Dorival Caymmi: o mar e o tempo", em versão ampliada. Das proezas do compositor, o livro narra, por exemplo, o episódio em que Caymmi, além da canção "O que é que a baiana tem", empresta à cantora os trejeitos com as mãos e reviradas maliciosas de olhos, que tornaram suas marcas registradas.
Sucesso
Da mãe, herdou o sangue mestiço, de portugueses e africanos, do pai, a ascendência italiana e o gosto pela música. Funcionário público, tocava piano, violão e bandolim.
O baiano chegou ao Rio de Janeiro em 1938, prestes a completar 24 anos, na intenção de cursar Direito. Trazia na bagagem umas poucas composições e um musical, "Caymmi e Suas Canções Praieiras", apresentado anos antes, em 1935, na Bahia.
No mesmo ano, conhece o sucesso pela voz de Carmen Miranda, que grava sua música no filme "Banana da Terra". Dorival segue na década de 1940 figurando entre os mais requisitados compositores brasileiros, com sua obra servindo de trilha, por exemplo, para filmes de Walt Disney.
Permanece no cenário nacional, entre os autores da era de ouro do rádio, nos anos 1950, ao lado dos mocinhos da Bossa Nova, em 1960, e da música que a ela se seguem nos anos seguintes.
"Ele estoura com 'Mãe Menininha' já nos anos 1970. Também com 'Gabriela'. Depois da Bossa, vem a era dos festivais, ele está lá. Com os baianos, os mineiros, figuras como João Bosco e Djavan, que aparecem também. Você vê que ele continua ai", diz Stella, reforçando que, não só por fazer parte do repertório dos diferentes ciclos, a música de Caymmi é atual por manter-se ligada, representativa em relação à produção contemporânea

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